sexta-feira, 27 de maio de 2011

Comidinhas de vovó...



Lembro-me bem de quando eu, ainda muito pequenina, precisava do auxílio de um tamborete para alcançar e apoiar-me no balcão da cozinha da casa de minha avó. Era um festival para os sentidos todas as vezes que eu me aproximava para observá-la cozinhar. O gostoso cheiro do alho pilado com o sal, a pimenta do reino finamente moída e a pitada de cominho que, segundo ela, era apenas para dar um cheirinho e um leve sabor na comida, pois não podia passar do ponto, senão botava tudo a perder. Tinha o colorífico de Urucum, que conhecíamos por colorau, a páprica e até o curry, cujo nome somente aprendi a pronunciar corretamente alguns anos mais tarde, quando já frequentava as aulinhas de inglês. Ah, não podemos esquecer da canela, em lascas e em pó, do cravo da índia e do leite de coco, que acabara de ser ralado manualmente com o ralador preso sob as coxas. Quanta saudade!
Não era à toa que o meu avô dizia que as três melhores coisas da vida eram o almoço em família, a sonequinha depois da refeição e acordar, ao cair da tardinha, com os dengos de minha avó, dizendo-lhe:
– Acorde, vá, meu velho, senão não vai restar sono para a noite! – e ela sabia bem o que dizia.
Quando acontecia dele adormecer e perder a hora de despertar, por ela não estar em casa para acordá-lo na hora devida, logo mais, quando feita a madrugada, ele perambulava pela casa, para lá e para cá, sem encontrar motivo para conseguir retomar o sono, face a tê-lo saciado na tarde anterior. E no dia seguinte, ai de nós: mal-humorado pela noite mal-dormida, sem dúvida, todos encontraríamos o seu mal-humor.
O cheiro da cebola dourando e da carne assando na panela resplandecia casa afora. O queijo de coalho na chapa e em finas fatias para gratinar os famosos escondidinhos de minha avó. E o feijão de caldo grosso que ela fazia?! Vixe! Nunca comi outro igual. Um verdadeiro segredo de família. Imbatível quando acompanhado da farofa de cuscuz de milho feita na manteiga de garrafa. Deus do céu! Chega a dar até fome só de lembrar de tanta gostosura. E ainda tinha as sobremesas: doce de goiaba e de jaca em calda – os meus preferidos, mamão com coco – outra delícia, compota de caju e de banana – em rodelinhas, indispensáveis! E os sucos de frutas?! De graviola – o preferido da mamãe, de mangaba – o preferido do papai, o de manga – o preferido de meu irmão e o de pitanga – o preferido de minha irmã. O meu preferido? Todos eles! E repetidas vezes, com bastante gelo, é claro. Ai, ai, é de dar água na boca e de fazer funcionar a memória depositada nas papilas gustativas.
E antes de se terminar a refeição com o famoso licor de jenipapo – proibido para os menores, tinha que ter o bolo de milho ou de laranja acompanhados de finos biscoitos de goma e um café quentinho, coado na hora! Ê, já não se faz banquetes como estes, de juntar toda a família para conversar ao redor da mesa com tanta frequência como antigamente. Mesmo assim, quando é possível, em um sábado ou domingo qualquer – não precisa ser uma data especial não, mas se for, melhor – toco o telefone convocando, de véspera, um por um e aviso em tom de cumplicidade e de satisfação:
– Amanhã vai ter aquele almocinho, aqui na casa da vovó e vocês estão todos convidados!

Receitinha básica de escondidinhos:

Unte levemente o fundo de uma tigela retangular de vidro (ou, de preferência, de cerâmica) com manteiga. Deposite uma camada de purê de macaxeira (aipim). Intercale porções em cubos bem pequenos de carne de sol ou de charque (carne seca ou jabá) fritas em cebola dourada em pedaços menores ainda. Se preferir, poderá desfiá-la. Repita todo o processo, cobrindo com uma última camada de purê. Por fim, por cima de tudo, cubra com fatias generosas de queijo de coalho. Regue com um pouco de manteiga de garrafa (pode ser derretida mesmo, se não tiver a legítima à disposição), cubra com papel alumínio e leve ao forno para gratinar. É simples e gostoso. É de “lamber os beiços”, como dizemos por estas bandas de cá. Ah, não se esqueça de dar um toque final: decore com raminhos cheiro verde! E você também pode variar de acordo com o seu gosto: introduzindo camadas de requeijão, por exemplo. Experimente e me diga o que achou...

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