segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Coisas mágicas


Por Antonio Nunes (Tonton)

Pijamas devem ser mesmo instrumentos mágicos. Quando vejo minha filhinha de pijamas, de imediato, me transporto para a minha infância, reavivando uma de minhas mais tenras memórias. Retorno aos já longínquos anos de 1974,1975 ou menos. E lá, me encontro ao colo de minha querida Dona Zefinha que, sentada ao tamborete, aguava a grama do jardim sob a luz do luar. Enquanto me segurava com uma das mãos e com a outra zigue-zagueava a mangueira para espalhar a água por todo o gramado, me contava histórias que povoavam o seu imaginário semianalfabeto, precioso imaginário que me fazia flutuar por tantos lugares e por tão agradáveis momentos em companhia de uma infinidade de personagens. Dali, daqueles sonhos vívidos, me conduzia à cama, para tomar lugar ao chão ao lado desta, onde continuava a sua incrível sessão de encantamento. Das histórias de “Camonge”, de Trancoso – que anos mais tarde vim saber se tratar de Trancoso, do autor, não da bela praia baiana – e dos contos de fadas adaptados pelo vocabulário de uma singela nordestina, fui conduzido aos livros. Muitos livros, por sinal, que entraram em minha vida para nunca mais sair. Foi neles, entre tantas descobertas, que encontrei Monteiro Lobato que me disse, em tom particular, que “Um país se faz com homens e livros”. Acreditei que aquela missão me era – e ainda me é – confiada. Afinal, pela leitura que eu reconhecia me modificar, encher de poderes a cada nova página vencida, eu me imaginava fazendo não apenas um país melhor, mas um mundo melhor. Então, certo dia, resolvi escrever meus próprios livros. E lá estava Lobato, outra vez. Desta feita, a me dizer que “Tudo é sonho ou loucura no começo”, mas que tanto já havia sido feito que não haveria por que se duvidar que não conseguisse, pois quase tudo na humanidade teria sido alcançado desta mesma maneira. E com tal força também acreditei nestas palavras que as cunhei como epígrafe na tese de doutoramento, imagem só – de Engenharia – que certa feita escrevi. Dizem-me, mal me recordo dessas remotas lembranças, que ainda de pijamas, nas manhãs de domingo, explorava as enciclopédias e os gibis, como se fossem parceiras de um mesmo gênero da literatura: a descoberta. Ao refletir a este respeito, compreendi que foi justamente aí que aprendi a viver tanto quanto possível desprovido de preconceitos, pois cada qual teve e tem sua importância na formação do neoleitor e do futuro escritor. E tudo o que eu mais queria, ou melhor, desejo, é que a minha filha tenha iguais oportunidades de descortinar o mundo. Mas como anseio por um mundo mais justo, mais igualitário, mais humano, não posso deixar de imaginar que este direito fundamental deveria ser integralmente cumprido ou atendido para todas as crianças de nosso imenso país. E não me dou por satisfeito quando ouço dizer que este direito deveria ser estendido a estas, pois este direito elas já têm, não há porque negar-lhes ou supostamente propiciar-lhes como algo adicional, porque, em realidade, não o é. Acredito, firmemente, no papel transformador que o acesso ao livro e à leitura pode propiciar aos jovens. Liberta-nos da solidão, alegra bem mais que a tristeza passageira e das emoções que nos invadem em certos textos – contundentes, emocionantes, verdadeiros e com tantos outros adjetivos bem próprios da boa literatura – e nos ensina tantas coisas: geografia, costumes, outras línguas, além de ajudar a consolidar o bem precioso da escrita, do vocabulário na língua pátria e tanto mais. A leitura é generosa provedora de quase tudo. Até que um dia dizemos para nós mesmos, que descobrimos como por encanto, de súbito, que temos um tesouro em mãos: sabemos nos expressar! E esta faculdade, acreditem, pode nos levar muito longe. Verdadeiramente por todo o mundo, como hoje estou aqui.

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